O que é que nos separa?

Parece-me que será quase um detalhe.

Nenhum votante ou apoiante dos partidos do Governo aplaude as medidas de austeridade que nos são impostas.
Muitos há que são funcionários públicos e sentirão na pele o que aí vem. Seria completamente idiota pensar que eles estão todos contentes com tudo isto.

Os apoiantes dos partidos de Esquerda também não estão contentes como se demonstra pela constante crítica a toda e qualquer medida do Governo.

Só que enquanto uns acreditam que é preciso fazer alguns sacrifícios para podermos ter um vislumbre de futuro, os outros querem tudo e querem já.

Ainda há pouco estava a ver o Frente a Frente na SIC Notícias e de cada vez que Bernardino Soares fala da Economia parte de um pressuposto que é no mínimo estranho: Os bancos estão cheios de dinheiro e não emprestam porque são mauzinhos.

Baseado nestes pressupostos, PCP e BE acham que a solução da crise é "malhar" nos bancos até não poder mais.
Aumentar a fiscalidade na banca
Perdoar aos pobrezinhos virtuosos que foram vítimas da banca sôfrega que lhes emprestou dinheiro
Aumentar os salários por forma a aumentar o gasto das famílias e assim salvar a pequena indústria e o pequeno comércio.

Ou esta gente não vive no mesmo país que eu, ou são completamente demagogos.
A banca navegou em lucros fantásticos à custa de um endividamento disparatado das famílias. O crédito era uma fonte de receita interminável de juros e tudo o que anda à volta disso. Comissões, taxas etc etc.
De repente muita desta gente deixou de pagar. Parou o afluxo de dinheiro mensal ao ponto de terem de ser executados.
Os bancos ficam com um ímóvel (quando não é crédito ao consumo) que vale hoje 60%-70% daquilo que valia quando foi avaliado. Imóvel que não consegue vender porque muito pouca gente tem dinheiro em mão para comprar uma casa a pronto.
Nos leilões os bancos financiam mas já pedem garantias que seriam impensáveis há 2 ou 3 anos atrás.

Assim, a banca tem uma mão cheia de crédito mal parado, um património imobiliário que não consegue vender e falta de liquidez bastante séria.
Não nos esqueçamos que os Governos de Sócrates usaram e abusaram da banca para se financiar e que com a crise das dívidas soberanas, e a exposição de alguns bancos às mesmas, o cenário é desolador.

Passou-se de campanhas para crédito a campanhas ara poupança num ápice. Até já sugerem poupar arredondamentos!!!

Não é por acaso que o financiamento que a banca pode dar é escasso. Nada ao Estado e muito pouco às empresas e muito menos aos particulares.
Com os lucros da banca a cair 70% num semestre, bem se pode aumentar o IRC da banca porque o resultado é igual - uma mão cheia de nada.

Quem trabalha na banca sabe bem o ar pesado que se vive em todos eles. Os tempos de glória e optimismo já passaram. Agora é apertar os cordões à bolsa e entender de uma vez por todas que lucros fabulosos são algo que não volta tão cedo.
A própria banca ajudou a destruir o mercado imobiliário. As construtoras fizeram o resto, junto com a loucura de compra de casa que todo e qualquer português fez, sem poder minimamente suportar a mesma se sofresse um embate complicado na sua vida.
O embate chegou e o descalabro também.

Esquecem também os partidos de esquerda que se Portugal foi pedir dinheiro não foi certamente porque tinha milhões para gastar à farta. O desequilíbrio era total e o descontrolo na execução orçamental evidente.
Se não existe forma se suportar o nível salarial que existia, como se pode propor que o Estado o incremente?
O PS negociou com a troika uma série de medidas absolutamente draconianas com prazos de execução e validação de progresso trimestrais.
Este Governo está obrigado a cumprir aquilo que o país assinou pela mão do negociador (Governo) com o acordo das outras forças políticas que hoje estão no Governo. Fê-lo para evitar pura  e simplesmente a quebra de pagamento de salários de Junho.

Acho uma certa graça quando ouço Mário Soares e outras personagens de esquerda a falar de soberania. Quase 15 anos da sua governação puseram-nos completamente na mão de quem nos empresta dinheiro para comer.
De nada serve o orgulho de sermos "soberanos" se andarmos todos sem um tostão para pagar o que quer que seja porque o salário deixou de ser recebido ao fim do mês.

Gente como eles deve ter uma almofada razoável para viver muitos anos sem ter de se preocupar, mas a maioria dos cidadãos destes país depende do que recebe mês a mês. De tal forma que os subsídios estão quase sempre comprometidos com gastos ao longo do ano.
Viveu-se em média muito acima do que se devia. O exemplo disso é a média de endividamento familiar. É um número de fazer andar a cabeça à roda.

No fim de contas não há muita coisa que nos divida, mas o que há é realmente importante. É algo de fundamental e é aquilo que separa a prudência da temeridade absoluta.
O PS olha para uma folga como algo que se pode desbaratar. O governo olha para uma folga como uma almofada em caso de desgraça. E como temos visto pelo cenário económico presente uma desgraça é o que pode acontecer de um momento para o outro.
O que é que preferem? Gastar já e um PECzito para repor o erro de previsão, ou uma almofada e alguma segurança em caso de crise grave?

Para mim é óbvio que sei qual é. Para muitos é gastar enquanto se tem.
Afinal foi isso que meteu muitos (e o país às mãos dos governos anteriores) num buraco que parece não ter fim.