O Estado Social

É uma coisa mais ou menos indefinível que este governo é acusado de destruir.

É espantoso como a lógica está ausente deste discurso omnipresente.

Andamos há anos (muitos que me lembre) a dizer que temos um Estado exagerado para o país que temos. Um Estado que consome metade da riqueza produzida pelo país.

Sócrates mal chegou ao poder disse-o. E começou a implementar medidas para o "reduzir". Uma delas foi deixar entrar apenas um funcionário para cada 2 que saíssem. Andava todo contente com a redução de pessoal. Mas todas as poupanças que eram feitas em massa salarial eram consumidas em pensões ou gastas em contratos com privados que comprometiam o país em largas dezenas de anos.

O peso do Estado ainda aumentou. Usando estratégias óbvias para muita gente, foi criando uma estrutura paralela e um rendilhado de instituições que consumiam milhares de milhões de Euros.
Estas instituições nada mais eram do que lugares dourados para a clique partidária e francamente incompetente que rodeia os partidos.

Sócrates começou a assistir à derrocada em 2008. Por inépcia total preferiu recorrer a um crédito barato para manter um Estado Social claramente inviável. Qualquer dos críticos da altura dizia bem alto que a dívida estava a disparar pelo telhado. E isso iria parar da pior maneira. Sócrates sabia-o mas preferia apaziguar a UE com PEC's. Um após o outro limitavam-se a agravar o problema em vez de o resolver. Eram feitos e concebidos para calar a UE durante uns tempos.

No entanto nessa altura nunca  se fez um esforço para reduzir efectivamente o peso do Estado. Os abusos continuavam à vara larga. Os lugares de nomeação política e os casos chocantes de nepotismo chegavam aos jornais todos os dias.
Nenhum dos críticos de hoje abriu a boca contra esse estado de coisas. O Estado Social que sustenta todos e cada um deles ainda funcionava apesar de ser óbvio que a coisa ia acabar.

Tão óbvio foi que Sócrates ele próprio  que se arriscou a ser impopular ao ir buscar 5% aos salários da função pública que estavam acima dos 1500 Euros.

Mas a verdade é que mesmo com essas medidas os resultados eram tímidos.
Até ao dia em que o mesmo Sócrates se vê forçado a pedir ajuda e faz um acordo que preconiza cortes na despesa de 5.000 milhões de redução de gastos do Estado ao ano durante 3 anos.

Era o reconhecimento de que o Estado Social estava falido e que o país enfrentava a bancarrota.

Deixou o país numa situação paradoxal. Falido, mas garantindo a múltiplos parceiros em PPP's um lucro intocado. Com contratos muitas das vezes sem qualquer visto do TC.

A redução que Sócrates acordou com a troika pressupunha cortes nas fatias mais polémicas dos gastos do Estado. Os salários da função pública e pensões.
Mas só isso não era suficiente. Para se conseguir atingir os números do deficit (ainda por cima partindo de um número falso) seria preciso fazer muito pior. Cortar nos gastos dos ministérios da saúde e educação, que são os que mais pesam no orçamento. Isto sem esquecer o pagamento de juros que logo em 2011 foi o maior "ministério" do país. Em 2012 foi de 8.000 milhões de Euros.

Tudo isto não foi obra deste governo. Foi obra de Sócrates. A ascensão e a queda abrupta de um homem que durante um mandato e meio fez aquilo que seria quase impossível - aumentar a divida do país quase para o dobro do valor com que o encontra.

Assumindo que temos mesmo de pagar o que pedimos emprestado, é óbvio que vai haver toda  a espécie de receitas e corte de despesas que se pode imaginar.

É relativamente cómodo estar agora a assistir à aplicação das medidas acordadas por Sòcrates e dizer que este governo está a destruir o Estado Social. Mas se calhar devíamos pensar que se não tivéssemos tido um 1º ministro como Sócrates e um ministro das Finanças que mais não era que um capacho talvez não precisássemos de o fazer.

Não se pode de maneira nenhuma assacar a este governo a culpa do Estado do país à data do pedido de ajuda. Nem é legítimo esperar que nada façam para reverter a situação.
Tem de ser feito. Sob pena de assistirmos à implosão do país.

Os resultados de anos de desmando vemo-los agora. Uma estrutura económica completamente desadequada, um sector primário dizimado, gente com qualificações duvidosas em sem qualquer aplicabilidade no mercado de trabalho. Empresas a viver de "rendas" por equipamentos que não precisávamos.
Não nos podemos esquecer que há mais de 10 anos que o nosso crescimento económico não pagava sequer as taxas de juro a que o país contraía empréstimos. O que nós tínhamos não era crescimento. Era estagnação.

Em 2011 éramos um país sem crescimento, sem soluções de futuro e com uma dívida massiva. Pior, com um compromisso assinado para outros cumprirem que inevitavelmente iria destruir o Estado tal como o conhecemos.

Parece existir uma espécie de prazo para qualquer governo resolver os problemas que encontra. Com este o prazo foi de um ano. Curioso como mandato é de 4 e o acordo é de 3 mas os portugueses (alguns, não todos) esperavam que por artes mágicas ele resolvesse tudo num ano. E quase assumindo que em economia tudo o que é uma previsão se torna uma realidade.

Quando ouço um Galamba ou outros economistas igualmente medíocres apontar o dedo ao único ministro das finanças com tomates que tivemos nos últimos 30 anos só posso mesmo sorrir.

Nenhum deles aceitaria o lugar. Mas se o fizesse, nenhum deles podia fazer de outra maneira. Quase parece que o devedor pode entrar pelo banco a dentro dar um murro a mesa e impor condições diferentes para evitar o colapso.

Pois não pode. E Portugal não pode porque houve gente que colocou o país nesta posição de debilidade e dependência. E são esses que agora dizem que o governo devia cortar na despesa. Mas sem atacar o "Estado Social". Ou seja, reduzir 15.000 milhões numa fatia que não chega provavelmente a esse valor.

Estou convencido que muitos repetem apenas o que ouvem sem grandes raciocínios. Não perceber o que se fez neste país até 2011 e achar que o relógio só começou a contar nessa altura é no mínimo um delírio.
Mas o sectarismo que envolve estas discussões, com o ruido da esquerda folclórica torna quase impossível a quem pouco se lembra do passado, perceber onde está o mal.

A maior parte só não quer fazer sacrifícios. Isso é para os outros. O português vive no presente. Não aprende com o passado (nem se lembra dele) nem tem uma ideia para o futuro. Só se rala com o que o afecta a ele HOJE.
É mesmo por isso que temos políticos assim. Sabem o povo que têm e sabem como manipulá-lo.
A falta de qualidade de um povo é bem visível naqueles que escolhe para o liderar.