7 de Janeiro de 2011... à tarde

Esta foi a conversa entre Manuel Alegre e Duarte Cordeiro, o seu director de campanha, na tarde de dia 7 de Janeiro

- Manuel, estamos metidos em sarilhos!
- Porquê? O problema intestinal não é assim tão grave e não tem esse tipo de manifestações.


- Não é isso pá! è a história da publicidade do BPP e os malditos 1500 euros.
- Ah, isso não se compara aos 150 mil do Cavaco. O problema dele é 100 vezes maior.


- Oh pá, ouve-me com atenção: A malta não aprecia este tipo de "descobertas". Sobretudo quando dás um nó cego a tentar explicar-te. Ainda fizeste pior

- Ora essa. Safo-me disso como me safei de tudo até agora. Só precisamos de encontrar uma boa história. Tenho passado a vida a dizer uma coisa e a fazer outra e mesmo assim ainda conseguir passar por um exemplo de integridade nas últimas eleições


- Então arranja lá uma desculpa para esta...
- Fazemos assim: Eu continuo a dizer que não percebo nada de dinheiro. Que não lhe toco porque ele é sujo.


- Pois, mas isso não te safa. É que tu, meu estúpido, passaste recibo verde pelos 1500 Euros e declaraste esse valor em IRS!!! Ou seja, tu assumiste por inteiro que tinhas recebido o dinheiro.


- Pois, mas devolvi!. Eu passei um cheque...
- Mas passaste um cheque a quem?


- À BBDO.
- Oh burro!! Quem te pagou foi o BPP! Quem te deu a declaração foi o BPP. Tinhas era que passar o cheque ao BPP


- Pois, mas eu não percebo nada de finanças. A minha secretária é que trata disso.
- Por falar da tua secretária, acho melhor largares essa. Passas a vida a dizer que és modesto e ter uma secretária não joga com isso. Quanto é que lhe pagas?


- Pago? Que raio de conversa é essa? Então eu pago à secretária? Porquê?
- Porra! Porque ela trabalha para ti! Tens de lhe pagar não?


- Oh pá, não me lixes! O que é isso de trabalhar? E ainda por cima para mim. Sê lá mais específico.
- Pronto (suspirando). As pessoas recebem um salário por fazer um trabalho. Exercem uma actividade durante um certo número de horas por dia, para um empresa ou para uma pessoa, e essa empresa ou pessoa paga-lhes em troca do trabalho.


- (boquiaberto) Então, estás a dizer-me que era suposto eu pagar à secretária? Alguém o deve fazer. Eu não. Já te disse que não percebo nada de finanças.


(Duarte Cordeiro estarrecido e em silêncio durante alguns minutos)
- Também consta que te mandaram umas provas do anúncio para ver se concordavas com o layout a publicar.
- Eu não vi nada disso. Podemos sempre dizer que foi a secretária.


- Bolas, mas quem é a secretária? Não pode ser a culpada de tudo
- Claro que pode. Ela podia estar a fazer isso porque eu não lhe pagava (sorri apercebendo-se do potencial da ideia)


- E o IRS? Foi ela que fez também não?
- Não. Isso fui eu. Eu gosto de pagar impostos de forma solidária por rendimentos que não tenho. É a minha veia altruísta. Eu sou um poeta caneco!!! Eu faço coisas desconexas. Tenho de manter uma pose de intelectual.


- E a história de suspenderes o anúncio porque na assembleia te lembraram que não podias fazer publicidade? Disseste ontem que ninguém te tinha dito nada. Caramba!!! Quanto mais falas mais te enterras. Isso para quem acha que tem o dom da palavra é uma bela cagada, deixa-me que te diga
- Pois, essa é bera. Não estou a ver como meto a secretária nisso...


- Pois é... Foste à caça e foste caçado. Como um patinho. E ainda por cima sujas-te pelo preço de um estojo para uma Purdey, porra!!!

- Olha, fazemos assim: Dizemos que eu paguei o IRS daqueles 1500 Euros porque gosto de contribuir. Que passei o cheque e a secretária ficou com ele. Que as provas do anúncio foram aprovadas por ela e que quando me disseram da assembleia, imediatamente mandei retirar o anúncio.


- É. Mas falta a história de teres afirmado que ninguém te tinha dito nada na assembleia...
- Pois, mas eu sou poeta. A minha forma de falar é muito elaborada e as pessoas percebem-me mal. Não te esqueças que vivemos num país onde os jovens não percebem sequer o que lêem. 
Exploramos essa via. Dizemos que não entenderam nada do que eu disse.


- Pronto. Está bem. Tu és o candidato. Tu saberás como te safar. Quando a gastroenterite passar voltamos à carga.
- OK. Mas o médico disse-me que pode não ser uma gastroenterite. Parece ser um problema auto imune


- Hum???
- Aparentemente o meu sistema imunitário está "revoltado" com tudo isto e resolveu actuar.

- E isso pode acontecer? Nunca tinha ouvido falar..

- Nem eu. Mas o médico disse que às vezes acontece em situações de stress extremo. Parece que o sistema imunitário entrou em parafuso e resolveu atacar a maior doença que encontrou - Eu.


- Bolas!!! E não se pode fazer nada?
- Não muito. Aparentemente o meu sistema imunitário está de tal forma determinado a acabar comigo que é muito difícil parar o ataque. É quase poético!! O meu corpo vê-me como a maior ameaça à minha pessoa. Incrível não é?
- Nem por isso. Agora que falas nisso sou forçado a concordar com o teu sistema imunitário. O teu problema não é exterior, é interior. Estanho é só ter acordado agora.


- Estranho não é? Logo agora que estava quase a ser alguém respeitado é que eu me lembrei de acabar "comigo".