Ainda o imobiliário...
Nos EUA a crise do subprime é despoletada por uma tentativa cega de fomentar o crédito hipotecário associado à construção.
Convenceram-se os Americanos de que se tivessem uma casa com uma hipoteca de 500.000 dólares estavam ricos. Mas como?
Fácil... Um ano depois de fazerem a hipoteca teriam uma casa a valer 700.000 e assim ainda se podiam dar ao luxo de fazer uma outra hipoteca e "embolsar" mais 200.000. Isto fez disparar e de que maneira os preços da habitação. A banca andava felicíssima. Concedia crédito como nunca e passou à fase seguinte. Conceder crédito a quem claramente não o podia pagar.
Juntavam toda esta tralha em derivados e vendiam com ratings triple A. Depois apostavam no incumprimento dos devedores.
Quando a bolha rebentou em 2008, a família com 2 hipotecas no valor de 700.000 tinha uma casa que afinal não tinha valorizado mas sim depreciado. Ficava sem a casa e com fortes probabilidades de ainda ficar a dever meio milhão.
Na Europa a coisa foi ligeiramente diferente. Em Portugal primeiro, logo no fim dos anos 90 e em Espanha pouco depois, entrou-se nesta loucura de preços de habitação completamente inflaccionados. Todas as semanas as casas subiam de preço. Sem razão aparente e sem seguir minimamente as leis da oferta e procura. A oferta era tanta que o lógico seria ver os preços descer. Mas não...
Como o dinheiro era "barato" e a banca dava crédito de forma aloucada, apenas porque o seu staff tinha objectivos dementes de concessão de crédito, as famílias nem se ralavam verdadeiramente se a casa que estavam a comprar valia os tais 500.000 euros ou não. Faziam umas continhas rápidas, viam que a prestação (que iriam arcar 30 anos e mais com taxas de juro que só podiam subir) podia ser paga e enfiavam-se num enorme buraco. Acreditando muitas vezes que a casa ainda iria valer mais passados 3 ou 4 anos.
Gente havia que trocava de casa cada ano. E de facto alguns ainda ganharam algum dinheiro neste carrossel de dívida e mais valia. Mas rapidamente acabou. E rapidamente as taxas de juro subiram e os empregos foram-se. Muita dessa gente está no rol dos que entregam a casa ao banco todos os dias. Mas que continuam com uma dívida para pagar, porque última casa de que nunca foram proprietários foi vendida a preço de saldo.
Mas olhando pelo outro lado as coisas não são melhores. A banca, sozinha ou com ajuda do imobiliário, meteu-se num buraco abismal. Endividou-se ela própria fora de portas, para trazer liquidez a um mercado imobiliário totalmente artificial.
Hoje essa mesma banca vê muito poucas hipóteses de reaver dos "clientes" o dinheiro que lhes emprestou e as casas com que ficou não valem, desculpem-me a expressão, um peido. E a cereja no topo do bolo é que têm um stock de habitação em 2ª mão e em 1ª mão para vender para o qual nunca encontrarão comprador.
Quer a banca quer as empresas do sector imobiliário merecem TUDO o que lhes está a acontecer.
O grave disto é que as empresas são as pessoas e muitas dessas pessoas perderão os empregos enquanto os administradores e sócios conseguiram amealhar um bom pé de meia, muitas das vezes de forma duvidosa. No fim é o mexilhão que irá pagar o colapso dessa miserável indústria que tomou o freio nos dentes como se as casas não se construissem com um objectivo.
O nosso problema é enorme. Mas o problema da Espanha é de proporções absurdas.
Um país que tinha uma percentagem de propriedade de casa de habitação muito baixa, saltou para valores impressionantes.
Hoje há bairros capazes de alojar milhares de famílias desocupados. Os promotores faliram e as casas são duma banca falida. Grandes bancos que apresentavam lucros fabulosos anos a fio estão hoje numa situação de não poder honrar os depósitos dos seus clientes. Daqueles que em vez de terem passivo tinham activos que esta banca usou para financiar a loucura dos outros.
Por lá, como por cá há aqueles que acham que a banca devia ser boazinha com os que foram "levados" nesta onda de consumismo imobiliário. Dão a casinha de volta e amigos como dantes.
O passivo, esse, fica do lado do banco que o irá tentar colmatar com ajudas estatais, com o apelo à poupança de outros e sobretudo com muita sorte.
O drama de uma banca de rastos é que isso afecta toda a sociedade. Afecta as empresas que não conseguem financiar-se porque a banca não tem sequer liquidez, afecta as poupanças de quem as conseguiu fazer e põe uma economia de rastos.
Foi a banca que fez isto a ela própria? Não totalmente. A política governamental desde cedo privilegiou este tipo de comportamentos. Cavaco Silva adorava a construção civil. Dizia que era a indústria nº 1 do país. Nunca houve uma real preocupação com a forma como as cidades iam crescer ou a com as consequências dum urbanismo totalmente desregrado e apenas determinado pelo lucro.
Hoje o resultado está aí para todos nós vermos.
Cidades absurdas, autarquias assoberbadas com despesas causadas por cidades enormes com centros vazios, gente a ficar sem a casa dos seus sonhos, banca a ficar sem as rendas mensais e a ver os seus lucros e liquidez a cair a pique..
Mesmo assim os representantes da "indústria" querem manifestar-se e exigir do governo uma solução. Solução? Querem que o Estado lhes compre as casas?
Sugiro que se juntem aos "desgraçados" do golfe com 23% de IVA e, caso consigam, que vão todos exactamente para o mesmo sítio - para a puta que os pariu.
Se o país se livrar desta praga que anda à volta da construção civil se calhar pode focar-se uma vez durante a minha vida em fazer alguma coisa de produtivo que nos traga alguma vantagem como país, em vez de apenas encher alguns bolsos.