Ainda o chumbo...
Para ser franco não é nada que eu não esperasse. O que não esperava eram as reacções de Passos Coelho e do PSD à decisão do TC.
Os juizes do TC chumbaram a medida fundamentando-se num princípio básico. O da igualdade. Está consagrado na Constituição e muito dificilmente se pode dizer que não deva estar lá.
O que faz com que as críticas aos juízes do TC ou à própria constituição sejam completamente descabidas. Ninguém espera por certo retirar este princípio numa revisão constitucional. Ou espera?
O trabalho dos juízes é complicado e simples ao mesmo tempo. Eles precisam saber apenas se à face da lei (constituição) existem violações. Não têm de pensar em variações, atenuantes ou motivos de força maior. Fizeram-no no ano passado para estranheza de muitos e não iriam certamente fazê-lo este ano.
Se fossemos imputar as responsabilidades que decorrem desta decisão a um grupo de juízes que tem apenas de se pronunciar nos termos da lei fundamental, nunca mais poderíamos contar com uma lei inconstitucional que não passasse por ausência de alternativas.
Fizeram o seu trabalho, fizeram-no bem e é o que se espera deles. Não se espera nem mais nem menos.
Por isso não gostei mesmo nada da imputação de responsabilidades que Passos fez no seu discurso. O facto de o país estar em maus lençóis não significa que se cometam todas as arbitrariedades em nome de um bem maior - as finanças públicas.
Para já porque não é um bem maior e por outro lado se o fizessem abririam a porta ao esbulho completo daqueles que não se podem defender e dependem do Estado. Passos Coelho devia, como um homemzinho, respeitar a decisão e centrar o seu discurso nas alternativas e na solução em vez de usar boa parte do seu tempo a assacar culpas ao TC. Já devia saber que o TC não iria repetir a graça do ano passado. Se não sabia devia ter-se acautelado para o pior cenário.
Diziam hoje que isto legitimaria o Governo a fazer cortes no Estado de forma ainda mais profunda.
Os despedimentos de funcionários públicos não seriam constitucionais pelo que o fantasma dos despedimentos em massa da função pública é acenado para fins propagandísticos mais do que por qualquer outra razão.
O que irá acontecer certamente é a dispensa de muitos que não têm o vínculo à função pública e estão a trabalhar para o Estado. Isso é claro e se pensarmos numa redução de despesa vai ser mesmo uma das componentes essenciais.
Mas há mais. Há muito mais onde o Estado pode ir buscar o que resultou deste chumbo e ninguém parece estar interessado em mexer.
As rendas abusivas pagas pelo Estado a um sem fim de entidades que conseguiram contratos completamente desproporcionais.
As coisas vão desde as rendas do sector eléctrico às absurdas medidas de aluguer de edifícios para serviços do Estado que deviam ser pura e simplesmente património seu passando pelas estradas que atravessam os país em todas as direcções.
Não é incomum uma empresa obter financiamento para a construção de um edifício e ir pagando "em prestações" sob a forma de renda. Mas no fim o edifício é seu.
No caso do Estado alienou-se património por meia dúzia de vinténs e arrendaram-se equipamentos sem qualquer opção final de compra. Pura e simplesmente aluguer. Que vistas as coisas sairá muito mais caro do que se o Estado financiasse obras suas (novas ou de recuperação) recorrendo a financiamento bancário.
Claro que nestas condições existe um cenário excelente para corrupção e troca de favores. Noutro cenário não seria fácil. E a julgar pela forma como certos contratos foram celebrados é caso para pensar quem é que terá recebido as comissões para assinar os ditos contratos ou para dar a ordem de assinatura. Creio que numa situação destas a suspeita é legítima e uma investigação judicial aos envolvidos seria fortemente aconselhável.
Num estado de emergência como nos encontramos será especialmente simples para o Estado unilateralmente declarar reduções de pagamentos com os seus "credores" de "rendas". Uma redução flat de uma determinada percentagem conseguiria muito facilmente poupar os 1300 milhões que ficaram a faltar para 2013. Rendas rodoviárias, energéticas e outras - redução de 20% ou 25%. Simples e fácil. Foi isso que fizeram sem mais aos funcionários públicos e nenhum tribunal deixaria de lhes dar razão. Ai sim a igualdade do esforço de TODOS seria assegurado.
No caso gritante das estradas, pedia-se uma avaliação independente do seu valor sendo as rendas eram simplesmente ajustadas de acordo com essas avaliações.
Acabavam-se as cláusulas de proteção fiscal ou de tráfego que são uma vergonha absoluta em contratos celebrados com o dinheiro de todos.
Um concessionário tem de assumir o risco de não ter tráfego. Se não o tiver baixa as portagens para ser competitivo. Se os impostos subirem está por sua conta como todos os negócios deste país.
Só com medidas como estas (sector rodoviário) o Estado pouparia os 1300 milhões e ainda ficava com margem de manobra.
Diria mesmo que só com este tipo de revisões o Estado consegue fazer as famigeradas poupanças de 4000 milhões sem ter de voltar de novo a comprometer as nossas reformas ou os nossos salários.
Se a situação é de emergência as medidas têm de ser excepcionais. Não se pode ter um sector de empresas do Estado cronicamente deficitárias e um desbarato de dinheiro sem justificação para o sector privado que negociou contratos absurdos e alguns deles ilegais (porque lhes faltou o visto prévio do Tribunal de Contas). Neste último caso a coisa é simples. Revogação e e contrato novo.
Quanto aos despedimentos na função pública, ou rescisões amigáveis, comecem pelos organismos que não se sabe para que servem que têm corpos dirigentes nomeados à pressão. Cada um desses vale em termos de salário por 2 ou 3 professores e os professores fazem-nos falta.
Existe tanto onde cortar que é quase patético ouvir os membros do Governo falar de cortes apenas para uma população que até agora pagou TODO o ajustamento. Haja alguma vergonha e haja alguma IGUALDADE.