Não é assim tão difícil de perceber
Mas custa-me muito acreditar que todos os que falam saibam só aquilo que dizem.
Há uma série de premissas das quais não podemos fugir. E há uma série de constrangimentos dos quais também não podemos fugir.
Assim, tudo o que possa ser pensado para por o país nos eixos não pode ignorar nenhuma destas coisas. Mas a verdade é que o discurso dos partidos prima por ignorar olimpicamente a maior parte delas.
1. O país tem um deficit crónico que tem resolvido com endividamento
2. O endividamento tornou-se impossível pelas elevadíssimas taxas de juro que atingimos durante 2011 e 2012
3. Para suprir esta falta de crédito, o FEEF emprestou a Portugal 78 mil milhões
Quanto a isto creio que não há muitas dúvidas quanto à sua veracidade. As razões para termos chegado aqui são abundatemente conhecidas, mas isso não vem ao caso.
A consequência mais evidente deste plano de ajuda é:
1. A dívida vai aumentar em 78 mil milhões pelo menos. Quem não percebe isto não sabe fazer contas
O FEEF impôs a Portugal uma série de condições para nos emprestar o dinheiro que precisávamos para, entre outras coias, pagar salários à função pública e pagar juros e capital de dívidas a atingir o ponto de maturidade. Forem elas:
1. Redução da despesa do Estado no valor de aproximadamente 15.000 milhões de Euros
2. Reforma do Estado
3. Reforma da Lei Laboral
4. Reforma da Justiça
5. Privatização de empresas
6. Fim da desorçamentação omnipresente nas nossas contas
Um dos pontos constante do MoU era a redução das rendas pagas pelo Estado no sector da energia e rodoviário.
Mas esse ponto não passou até agora de uma leve poupança. Muito longe daquilo que poderia ser.
Para garantir que estas condiç\oes eram cumpridas, o dinheiro é entregue em tranches após avaliações trimestrais onde são avaliados objectivos passados e estabelecidos outros para o período seguinte.
Disto resultou:
1. Privatização da EDP, ANA e tentativa de privatização da TAP e RTP
2. Redução de salários na função pública
3. Redução de prestações sociais
4. Alteração de regras de pagamento de horas extraordinárias e abonos
5. Alteração das regras de indemnização por despedimento
6. Aumento da carga fiscal em sede de IRS, IMI, e IVA (mudança de taxa)
7. Redução do nº de contratados no Estado (o caso dos professores é o mais óbvio e volumoso)
O que é que se espera que aconteça numa situação destas? Vários destes pontos causam uma redução de dinheiro disponível nas mãos dos cidadãos. Não é preciso ser nenhum génio para perceber que:
1. Incumprimento cada vez mais generalizado das obrigações de crédito
2. Os bancos vão deixar de dar crédito à parva com medo do "mal parado"
3. O crédito mal parado nos bancos vai aumentar
4. As famílias vão ter menos poder de compra
5. O consumo das famílias vai reduzir-se consideravelmente
As consequências são óbvias. E as duas coisas que mais vão sofrer são aquelas que nos custam mais dinheiro durante a nossa vida. A casa e o carro.
1. A venda de automóveis vai cair (a maior parte era feita a crédito)
2. A venda de casas vai cair
3. O consumo de combustíveis vai cair
4. O consumo de tudo o que pode ser considerado supérfluo vai cair
5. Abandono do ensino superior, sobretudo o privado, vai impactar as Universidades a ponto de serem extintos cursos.
e isto vai causar
1. Empresas fecham as portas por prejuízos acumulados ou para prevenir que isso aconteça
2. Postos de trabalho perdidos. Desemprego a aumenta. O ponto 2 anterior contrubuiu de forma muito considerável para este aumento de desemprego. Estima-se que em 30%
3. Mais gente dependente do Estado para receber o subsídio de desemprego
4. Mais gente a emigrar para fugir ao espectro do desemprego e da mera sobrevivência
5. Menos gente a contribuir com os seus rendimentos para receita fiscal
6. Menos empresas a contribuir para a receita fiscal
É óbvio que mesmo que se aumentem as taxas de imposto, a partir daqui o efeito é o contrário do pretendido. A receita irá baixar se isso acontecer. E o Estado irá ter mais encargos para suportar a vaga de desemprego que isso iria causar. Ou então teria de dividir um bolo ainda menor por um grupo ainda maior.
A única coisa de bom que saiu de tudo isto é que as empresas que outrora apostavam só no consumo interno, passam a pensar nas exportações para garantir a sua sobrevivência. E essa subida é algo de incontestável.
As relações causa/efeito podem estar aqui expressas de forma um pouco simplista, mas são em linha geral isto.
Nenhum partido que olhe para a situação pode dizer que isto não era esperado. Debaixo de um plano de ajuda como o nosso é totalmente ridículo esperar que os problemas se resolvam em 2 anos. O mais grave é que a conjuntura económica internacional também não é brilhante e causa alguma entropia num sistema preso por fios. Esperar que o plano vá do princípio ao fim dentro das previsões é de quem pensa que as sociedades e a economia são coisas exactas, científicas e reproduzíveis. Não são.
Por isso quando ouço Seguro apontar soluções para este problema fico fascinado com o grau de inocência que demonstra. Ou de má fé. Ele, sendo naturalmente imbecil, pode até acreditar no que está a dizer, mas outros há que sabem que o que Seguro diz é impossível. É uma mentira.
Esperar que se vá para uma negociação com o BCE exigindo a devolução de mais valias feitas com a dívida portuguesa é no mínimo patético. Numa negociação há duas partes. Neste caso uma extremamente débil e outra totalmente poderosa. Acham que a parte poderosa vai dar dinheiro de mão beijada Portugal só porque Seguro o pede?
Outras propostas partem do princípio que o Estado deve fomentar a economia para a fazer sair do ciclo recessivo. Sabendo nós os fantásticos resultados que isso deu, como podemos nós esperar que dê um resultado diferente? Acresce a isso que agora não há dinheiro para "fomentos". Não há maneira de esconder desempregados em estágios pagos, ou ajudas a empresas falidas.
Falidas como o estão todas as empresas do sector público. Que a juntar aos prejuízos operacionais endémicos ainda juntaram perdas de "casino" da ordem dos 3.000 milhões (que se saiba) embarcando em contratos de swap de taxas de juro com características verdadeiramente duvidosas.
Temos depois o PCP e o Bloco.
A abordagem destes dois partidos é quase tão simplista como este pequeno post mas, ao contrário do PS, sabem perfeitamente que não há dinheiro e que a dívida é um pedregulho em cima de nós.
E por isso propõem uma coisa muito simples. Não pagar a dívida.
O que é que isto causaria no dia seguinte a uma declaração de "não pagamos"?
1. Taxas de juro da divida soberana em todas as maturidades dispararia para valores incomportáveis
2. Portugal não poderia financiar-se nos mercados de dívida
3. O FEEF cortaria a ajuda nas tranches restantes
4. Portugal seria forçado a voltar à sua moeda desvalorizando-a de forma substancial
5. O nosso poder de compra cairia a pique
6. Incapacidade de pagar as exportações, nomeadamente petróleo, e gás
7. Colapso na produção de energia. Só conseguimos ser auto suficientes com renováveis em anos de pluviosidade anormal como este. E apenas em períodos limitados. Neste momento já não produzimos o que consumimos.
8. Emigração ainda mais pronunciada. Todos os que pudessem fazer uso das suas qualificações fora do país, fá-lo-iam.
9. Num cenário de colapso económico a receita do Estado sofreria ainda mais. As ajudas sociais não passariam de uma miragem.
Ou seja, seria como amputar uma perna por se ter uma unha encravada no pé.
E sabendo isto, ou pelo menos podendo antever isto, estes partido persistem neste discurso. Sabendo perfeitamente que o que estão a prometer às pessoas (a solução para o mal) é um mal ainda pior.
Não é por acaso que estes partidos têm uma representação marginal na sociedade. Ainda assim há quem morra por estas ideias. Que pressupõem um Estado dono de tudo e com total capacidade de viver isolado do resto do mundo.
Ainda não aprenderam nada com Cuba e com o seu modelo assente na solidariedade da USSR. Que quando acabou os tornou num país num estado de absoluta miséria. Sobreviver em vez de viver.
Mas se o que o PCP e o Bloco dizem é conversa para agradar a fanáticos, aquilo que o PS diz é muito mais grave.
E é mais grave porque o PS é um partido de poder. De tal forma que lá esteve 12 em 15 anos possíveis. De tal forma que foi o PS que causou isto na sua quase totalidade.
E apesar de o terem feito não aprenderam nada.
O que me leva a concluir que não devem conseguir fazer melhor.
E vem o Secretário Geral falar num congresso como se de uma alma pura se tratasse. Como se FINALMENTE tivéssemos alguém capaz não só de não repetir o que os outros fizeram como de resolver o que eles fizeram.
Os seus camaradas...
Aqueles que num espaço de 6 anos duplicaram a divida. E que pediram mais 78.000 milhões que faltavam quando saíram.
O que me parece é que na política existe gente demais que pouco sabe e se limita a repetir os chavões que ouve dos seus lideres.
No PS a competência não é propriamente abundante. A honestidade também não. Juntem essas duas coisas e a mistura é explosiva.
Mas a chatice é que a explosão é para o nosso lado. E depois de estarmos a tentar sobreviver à ultima explosão que provocaram, ainda têm a esperança de voltar ao poder para causar uma ainda maior.