Os media (10)
Os famigerados fazedores de opinião, andam num corropio por tudo o que é media deste país a tentar passar a ideia de que a investigação pela justiça de políticos eleitos é um passo perigoso e absolutamente indesejável.
Vem isto a propósito da queixa apresentada ao MP sobre as despesas realizadas pelos gabinetes ministeriais dos governos anteriores.
Quando se alterou o estatuto dos magistrados, o argumento central dessa discussão foi a de eliminar privilégios e regalias injustificadas. Está por saber o que é que é injustificado. Se é a eliminação de uma forma de compensação pela sucessiva perda de salário por parte de profissionais superiores então isso é no mínimo estranho.
Sobretudo enquanto assessores de duvidosa craveira e funcionários políticos tinham regalias e privilégios injustificados (esses sim) no governo que apontou as armas à magistratura.
Como tal, foi pedido que essas regalias e benefícios fossem revelados de acordo com a lei.
Coisa que o Governo de Sócrates se recusou fazer. Porquê? Agora sabemos porque um tribunal obrigou o Governo a revelar essa informação.
E ela não pinta um retrato muito bonito da forma como os políticos dos PEC's conduziam a sua contenção de gastos.
Por causa deste caso fala-se muito da judicialização da política. por oposição a um silêncio total acerca da politização da justiça. Como se por acaso um crime cometido no exercício de funções políticas devesse, ou pudesse, estar fora da alçada da justiça.
Sendo o poder judicial um poder independente do executivo (e muitas tentativas foram feitas para que não fosse desde o Caso Casa Pia) o que toda esta gente está a dizer é que algo que um cidadão comum faz e é condenável, não o é se for feito por um político.
Esta pretensão põe um selo de impunidade formal sobre crimes cometidos enquanto detentor de um cargo político.
Por outro lado muitos dos que dizem isto insurgem-se conta o facto de Isaltino não estar preso.
E talvez não esteja preso porque quando foi decretada a sua prisão (porque na Relação alguém não informou o tribunal de 1ª instância adequadamente) todos se atiraram à jugular da juíza por o ter feito. Desde os advogados (compreensível) até aos media sequiosos de escândalo e sangue.
Depois perante a hipótese de prescrição de alguns dos crimes por causa do novelo dos recursos, a juíza cautelosa não quer correr nenhum risco. Aguarda informações de quem tiver de as dar para que quando decretar de novo a prisão seja absolutamente seguro fazê-lo.
Com toda a sanha anti judicial que grassa nos media pela mão dos "fazedores" de opinião, mais vale ter cuidado com as decisões. Mesmo sabendo sempre que quaisquer que elas sejam não serão consensuais.
Quando leio coisas como as que escreve o desonesto Miguel Sousa Tavares ou afirmações proferidas por Francisco Assis ou Daniel Proença de Carvalho, apercebo-me até que ponto este "clamar" por justiça que eles aparentam fazer, é apenas destinado ao cidadão comum.
Não há uma alminha que esteja na política ou que tenha relações com quem esteja na política que veja com bons olhos a investigação de actos potencialmente ilegais.
Eles não são muito claros e não dizem preto no branco que não se devia fazer. Dizem apenas que isso "não faz sentido" ou que é um "passo perigoso" para dar a entender que é melhor as coisas estarem como estão.
É que se abrirem a caixa de Pandora, quantos destes que apelam a um "esquecer" das coisas não são apanhados na corrente? Quantos não têm podres a esconder desde há 37 anos?
A violação da lei não é complicada de aferir. Se uma decisão resulta num gasto não autorizado na lei ou claramente violador da lei, o seu autor deve ser julgado como qualquer cidadão normal.
O facto de vir a ser eleito ou reeleito não legitima o que fez.
Isso é o que defende Isaltino, ou mais recentemente os sabujos de Sócrates que acham castigo suficiente ele ter perdido as eleições.
Isso não é castigo. Não existe essa treta de julgamento político para crimes comuns. Há crime e não há a distinção de ser político ou não.
Não é minimamente aceitável que a corrupção que grassa por este país, a irresponsabilidade das decisões acabe por ser paga por todos nós podendo os seus autores recandidatar-se alegremente a outros lugares sem qualquer averiguação dos seus actos.
Não é aceitável que alguém que seja condenado numa 1ª instância por crimes cometidos enquanto detentor de um lugar político não perca imediatamente o mandato com suspensão de benefícios e de salário. Se em recurso se comprovar que há um erro é fácil repor a situação. O contrário não é verdade.
Em bom rigor, logo que fosse constituído arguido a suspensão de mandato devia ser automátca para crimes de determinada natureza.
Deixar alguém assim em funções é dar acesso ao potencial criminoso a uma posição de poder em que pode comprometer a investigação, destruir indícios, intimidar testemunhas. Razões bastantes para porem um cidadão comum em prisão preventiva.
Mas depois de uma condenação em 1ª instância, não fazer nada é passar um atestado de inutilidade a todo o trabalho gasto. Se for assim, mais vale não haver relação nem 1ª instância. Fique-se só com com o Supremo ou com o Constitucional, já que parecem ser as únicas decisões com consequências. Até lá os criminosos passeiam-se por aí até os crimes prescreveram
Se não parece estranho a um povo como o Islandês por um ex 1º Ministro no banco dos réus, porque nos parece tão estranho a nós?
E quando digo a nós não estou obviamente a referir-me ao povo votante e contribuinte. Estou a referir-me a uma estreita faixa da população que tem acesso aos meios de comunicação e acha que "faz" opinião.
Este grupo pretende deformar opinião ao contrário daquilo que devia fazer que era ajudar a formar opinião.
Isto tem tido como resultado um desprestígio da justiça (e de outros sectores) com o martelar constante dos nossos ouvidos de opiniões enviesadas, distorcidas e falsas do que se passa no sistema judicial. Não é que o sistema não tenha defeitos, mas muitos deles são da exclusiva responsabilidade do legislador - os políticos.
Muito poucas vezes se ouve falar disto de forma séria ou informada. Muitas vezes se ouve falar de forma intencionalmente desonesta como foi o caso do recente artigo de MST que não era mais que uma peça ignorante, preconceituosa, intelectualmente desonesta e arrogante. Estes adjectivos são provavelmente a mais perfeita caracterização do próprio autor.
E ele e outros como ele têm acesso completo aos jornais televisões e rádios deste país ajudando a orientar uma massa de acéfalos numa determinada direcção.
Foi assim contra a magistratura e foi assim contra os professores. Não devo ter ouvido muitas declarações honestas e isentas sobre estes temas durante os últimos anos.
Os media e os "fazedores" de opinião preferem tricas sobre o PGR ou sobre o Presidente do Supremo.
No entanto preferem esquecer os contratos de arrendamentos de tribunais ruinosos para o Estado ou as despesas de cartões de crédito (e seguramente outras) custeadas por dinheiros não orçamentados.
Preferem esquecer o caos legislativo causado por sucessivas alterações casuísticas, muitas delas à medida de crimes em julgamento, feitas pelos políticos ou por gabinetes contratados e pagos por esse mesmo poder político.
Os media deixaram de veicular informação de forma isenta e critica e passaram a ser o megafone de grupos de interesse e de pressão, vulgo "fazedores de opinião".
Que me importa a mim que um Adão e Silva se insurja contra a judicialização da política? Não é ele político por acaso?
Que me interessa a opinião de um Marques Lopes acerca do que quer que seja? Ou de uma Clara Ferreira Alves que toda a sua vida recente gravitou à volta da política e dos políticos?
São eles fazedores de opinião ou serão antes protectores dos seus interesses?
Então, porque é que personagens destes têm direito a espaços de comentário e horas de televisão e rádio e colunas de opinião por tudo o que é jornal?
É este lixo ético e intelectual a única coisa que o jornalismo tem para nos oferecer? Não há mais nada? Mesmo mais nada?
Os hábitos da manipulação da informação de Sócrates sobreviveram-lhe. Não há um único evento político, seja um congresso, seja uma presença do governo na assembleia que não valha comentários apalermados de jornalistas e de comentadores a soldo. Até já jornalistas sem craveira metem as suas buchas "espirituosas" no fim das peças jornalísticas.
Em tudo veem fragilização. Pode ser apenas um esclarecimento do presidente do PSD no congresso ou um discurso do Ministro da Economia no parlamento.
Respeitava-se um vigarista fizesse ele o que fizesse, desrespeitam-se todos os que estão a limpar a porcaria que ele fez.
Dá-se eco às declarações acéfalas de Seguro sem um comentário jocoso (e sabe Deus como as suas intervenções poderiam ser alvo de comentários jocosos) mas há sempre uma buchazinha espirituosa se for alguém da outra cor.
BTW, não assisti a nenhum comentário jocoso acerca da gaffe de Ruben de Carvalho quando qualificou como arrogante o facto do ministro das Finanças alemão não se levantar para falar com Vitor Gaspar. Nem ouvi sequer as desculpas do próprio.
Talvez porque os erros cometidos a coberto do sectarismo político sejam muito difíceis de reconhecer para quem está convencido que possui a verdade. Mas ao menos um daqueles jornalistas que só sabe fazer perguntas estúpidas pudesse por uma vez perguntar-lhe: "Tem a dizer alguma coisa relativamente à razão pela qual o ministro alemão não se levantou para falar com Vitor Gaspar? Ainda acha que é arrogância? Ou acha que é apenas por causa dele ser paraplégico desde 1991?"