Um bloco esboroado
Não bastava já a existência de cisões internas e o abandono do Grande Líder, ainda tinham que ter escolhido para sucessores um par de pobres diabos sem chama nem glória.
Louçã tinha uma arte especial de mentir convictamente. O espectáculo das suas palavras sobrepunha-se ao conteúdo. O ar assertivo e o ênfase em alguns momentos do discurso quase apagava os disparates que dizia. Tinha currículo. Feito no ensino público e obviamente à custa também das suas capacidades intelectuais.
Por isso conseguiu lançar sobre si o manto do esquecimento. Praticamente ninguém se lembra ou sabe o que era Louçã antes do Bloco. O PSR, aquele grupo revolucionário que defendia o impensável, com um líder que adorava a Albânia de Hoxha.
De tudo o que era radical, o PSR tinha um lugarzinho especial. Todos se transformaram em nada. LCI, AOC, MRPP, UDP. Mas o PSR renasceu das cinzas e criou o bloco.
Talvez devêssemos dizer que o Bloco era Louçã. Poucos teriam a inteligência de recriar do nada um partido de ideologia comunista travestido de aglutinador dos que sofrem.
Louçã era um líder culto, capaz de ter uma conversa com pose de Estado e um manipulador nato. Não foi por acaso que se tornou na coqueluche dos media. Fica sempre bem ter um revolucionário como amigo. Um tipo que sabe falar e mastigar o croquete de boca fechada. Nada que se pareça com a horda de broncos do PCP que não têm preparação nem pose para frequentar os melhores ambientes.
O problema do Bloco é que Louçã se foi. E deixou à frente do partido duas criaturas que muito dificilmente conseguirão manter o bloco na posição que já ocupou.
João Semedo parece ser um bom homem. Com experiência de vida, médico e conhecedor pelo menos do sistema de saúde neste país. Talvez não o conheça do ponto de vista administrativo ou de gestão mas pelo menos viveu nele e já o ouvi dizer coisas muito acertadas acerca da saúde em Portugal.
Só que o pobre Semedo não passa disso. O seu discurso é soporífero e recheado de chavões proto comunistas. Não há outro remédio senão olhar para ele e ver um fóssil. E era essa arte de Louçã: tinha discurso de fóssil que parecia novo... mas não era.
Catarina Martins é a todos os títulos uma barata tonta. A sua principal ocupação é indignar-se muito. Poderá saber como funciona um partido mas claramente não sabe muito de política. Não se pode dizer que seja alguém muito por dentro da história do pensamento político nem que tenha um "vasto" conhecimento da matéria.
A sua mania de se sair com frases lapidares choca quase sempre com o ridículo das afirmações. Debate como uma débil mental e indigna-se com as coisas mais disparatadas que se possa imaginar (mas neste particular ainda não consegue bater o vazio Seguro...).
A imagem que temos hoje do Bloco é muito diferente da que tínhamos com Louçã. Por muito aldrabão e pequeno burguês que fosse Louçã, ainda era daqueles tipos com quem se podia ter uma conversa.
Com estes dois a vontade que dá é deixar Semedo a falar sozinho e esganar Catarina Martins. Não são claramente o tipo de pessoas que possam ser a coqueluche dos media. De tal forma é assim que a presença do bloco nos alinhamentos televisivos caiu tremendamente.
Ao ouvir Semedo na apresentação como candidato à CML a única coisa que ocorre fazer é dar um longo bocejo. Os chavões "da esquerda" e a tentativa de se afirmar como qualquer coisa de diferente chocam inexoravelmente com a realidade. A esquerda tal como a concebe Semedo é completamente incapaz de se adaptar à realidade. É apenas capaz de ter a sua própria realidade que não é, nem pouco mais ou menos, possível.
Outros bem falantes do Bloco desapareceram. Daniel Oliveira que é sempre aquele tipo que está com um pé dentro e um pé fora (acha-se um livre pensador) escrevinha umas coisas no Expresso e diz umas insanidades no Eixo do Mal com um ar grave. Mas a verdade é que lhe parece mais apetecível o poder do que a "luta" sem vantagens. E disse-o numa reunião geral do Bloco (ou como raio chamem aquele ajuntamento) para estupefação dos presentes que o votaram ao degredo.
Rosas passou a viver confortavelmente da sua cátedra e diz umas coisas na TVI24. Fazenda desapareceu quase completamente dos media. E quando aparece também não passa dum daqueles tipos que diz coisas e faz afirmações por uma questão de fé.
O facto é que nada do que dizem é consubstanciado pelos factos ou pela realidade. Acreditam, e pronto. Se tirarmos o conteúdo da crença estão ao mesmo nível que os cristãos radicais nos EUA. É fé.
Imagino que o Bloco que pode ter gente cheia de boas intenções se vá afundando paulatinamente com estes dois pobres diabos na frente. Por muito líder do Syriza que mandem vir para as manifs ou por muita solidariedade que demonstrem pelos rebeldes na Siria. As causas do Bloco passaram a ser quase alienígenas. E no caso das causas locais são apenas redundantes. Em nada se distinguem das constantes profecias de desgraça do PCP ou das boas intenções do PS.
O Bloco, como dizia um conhecido meu, nem é carne nem é peixe. É uma grande merda.
E convenhamos que andar a bradar pela expulsão da Troyka e o não pagamento das dívidas e ao mesmo tempo dizer que isso melhora a situação dum povo já na desgraça ou é uma mentira descarada e consciente ou é um total desfasamento da realidade e o alhear completo das consequências que uma coisa dessas podia causar ao país. Em qualquer dos casos não é lá muito abonatório para a inteligência dos líderes programáticos deste pequeno partido.
Os portugueses de alguma idade sabem bem o que aconteceu com a desvalorização do Escudo (forçada mais uma vez pelas asneiras incríveis cometidas pela esquerda neste país) e com o racionamento de bens essenciais como o leite ou da escassez de carne e outros bens essenciais nos anos que se seguiram ao 25 de Abril.
O que esta gente propõe como alternativa à frigideira é o lume. E fazem-no por uma questão de fé. Ou não têm noção das consequências por mera estupidez ou porventura acham que alguma vez serão poder e podem controlar com mão de ferro um país descontente e miserável.